sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Querida Madame,

Gostei de ti à primeira vista. Leve, livre, compreensiva, aérea e enraizada, fluída e simpática. Imaginei uma amizade aqui nesta nova terra. E dizes que sim que somos pessoas por quem nutres carinho.

Diz o ditado que "amigos, amigos negócios à parte" e deve ser mesmo um bom conselho pois deste que tivemos intenção de fazer algo mais profissional em conjunto algo que nos pareceu unir, na expectativa, nos tornou mais frios no fracasso de uma não-resposta. Sinto uma competição que não me faz sentido corresponder. Na verdade, sinto vontade de fazer uma triagem e separar as águas: enviar o que se sintoniza contigo e trazer a mim o que se integrará naturalmente comigo.

A última irritação foi saber que um grupo do qual já tinha conhecimento te encontrou. A nós nem uma palavra e contigo tudo parece fluir no sentido de uma verdadeira escola de artes ancestrais. Decidi afastar-me pois imaginava algo mais complementar onde todos ganharíamos. Recuso-me a entrar em competição. Se não conseguimos uma integração ajudarei numa boa triagem: uma para ti, outro para mim, bem-me-quer-mal-me-quer. Não é nisto que acredito mas se a união não é possível para já, fiquemos na dualidade mas conscientemente que a estamos a manter, mesmo que pensemos ter outros valores.

Estou aqui quando quisermos todos que seja de outra forma. Quando o combustível fóssil se esgotar e todas as alternativas forem totalmente necessárias simultaneamente para viver. Estou aqui quando todos formos necessários na orquestra, quando não existirem os de nome e os órfãos.

Fico exactamente onde estou: no meu lugar, aquele que me pertence, pertenceu e pertencerá.

Todos somos necessários, nem mais nem menos.

A única verdadeira realidade é a cooperação. É ela que vai transformar este mundo. É o elemento que falta manifestar e é o ser humano que o pode realizar.

Fico à espera. Calmamente.

Não me mexo noutro sentido.

Sei que não vou por aí!

A tua,

Madame cá de cima

terça-feira, 29 de julho de 2014

Cara Romana,

A guerra começa entre cada um de nós antes de se tornar mundial. Relaciona-se com recursos e necessidades humanas antes de se tornar nacionalismo e capitalismo. Penso que a nossa história se explica assim.

Desde que te conheci que vi em ti um encanto melancólico. Penso que me apaixonei por ti e pensei que também gostasses de mim. Gostava dos teus carinhos, dos teus presentes sempre oportunos e de alguém que parecia conhecer a minha alma, da tua escuta e das tuas palavras de admiração. Não escutei a minha voz interior quando um dia te convidei para escutares uma canção que tínhamos acabado de criar, e um grito e um nó se formaram na minha garganta. Pensei sempre que era eu que era envergonhada. Que os bons amigos são exactamente com quem devemos partilhar tesouros. Tapei a cara e passou.

Noutra ocasião começaste a admirar o meu companheiro depois de te mostrar a sua face mais feliz. Sentiste amor e tiveste vontade de te unir a nós, mas nunca mo disseste e assim ficou. Ele disse-me que lhe tinhas feito menção a um qualquer acto amoroso entre três mas a mim nada foi dito.

Passado uns meses confrontei-te, negaste: não me lembro nada disso... deve ter sido um momento. Um momento que naqueles tempos talvez tenha estragado a minha vida. O gérmen da dúvida, o gérmen da dispersão, e da desconfiança. Perdoei-te. Não chegaste a fazer nada. E o meu relacionamento terminou melancólico, dorido, quase sem vida.

Esqueci-me: voltei a procurar-te para falar das tristezas e alegrias e caminharmos juntas, comermos juntas, estar juntas num sentimento cálido, fraterno.

E sempre gostava de estar ao teu lado.

Há pouco tempo mudei de casa e estivemos longe uma da outra por mais tempo desde estes cerca de 10 anos de relação. Agora vejo que é uma relação. Vieste conhecer o meu novo lar, o meu novo amor, as minhas novas ambições. Adoraste estar aqui e eu também estava feliz, até que me comecei a sentir mal. Foste embora e já não trocavas ideias comigo mas com o meu novo amor. Alto! O que se passou afinal?
Já vivi algo parecido... Será que por amor te integras no casal sem pedir licença, principalmente a mim. Só porque te tenho carinho? O que pensas que sinto?

Percebi que afinal sempre existiu uma guerra silenciosa com pintura de calma. Uma guerra fria, pelos recursos do prazer, do calor, da atenção, do colo. Recebi muito, eu sei, muitas vezes, mas a que preço?

Agora que abri os olhos escolhi o meu novo amor e tenho de te dizer adeus. No fundo tenho feito o papel de ponte para quem quiser entrar no universo que vou construindo, mas eu, afinal de contas, construí-o com outro propósito: viver nele e ser nutrida nele. Assim não sobra nada para mim. Por isso: ADEUS.

A tua,

Bhakti

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Querido Saulo,

Foste a pessoa que mais me fez feliz e tenho o meu coração e memória presos a todos os bons momentos que passámos. Sei que não és perfeito mas para mim foste o que necessitava sem tirar nem pôr. É por esta razão que te escrevo: quero que me libertes de ti, não porque me tenhas feito mal e necessito continuar, mas porque me fizeste bem e agora tenho que viver o momento presente. O passado é controlável, já passou e não se muda, mas podemos tocá-lo na nossa memória vezes e vezes sem conta. Quando algo correu bem podemos sempre resaboreá-lo. Contudo, sinto que me estou a afastar do aqui e agora. Tu sempre me disseste para continuar, para namorar nesta vida e ser feliz, mas dentro de mim algo ficou bem perto de ti e da casa que partilhámos que já nem sequer existe como tua. Tudo mudou e eu fiquei agarrada ao passado. É isto que não me está a ajudar. Eu sinto que se te deixar de amar interiormente estou a trair-me a mim mesma. Assim, vou acumulando amores e desamores e não limpo a minha casa. Na verdade, uma das coisas que me fez melhor no nosso encontro foi ter deixado o passado para trás por ser por demais doloroso e por isso estava totalmente disponível para receber. Agora necessito de libertar-me do que foi muito prazeroso pois também  me está a quebrar o fluir da vida. Honro a tua memória-síntese mas necessito libertar-me das nossas aventuras e desventuras concretas. Deixo aqui a minha intenção e propósito para o fim de uma relação interior profícua e bela mas que também necessita de um fim. O fim que nos dará ainda mais vida: morte-vida-morte-vida-morte-vida-morte...